terça-feira, 11 de junho de 2013

Apenas um par de asas

Há algum tempo um torpor tomava conta da sua mente. Ela andava há horas, sem saber exatamente para onde iria. Vagou sem rumo pelas ruas enquanto a noite ia tomando conta da cidade. Estava frio, era inverno e a paisagem toda lembrava solidão. O branco da neve tomava conta de todo o caminho. Ela entrou no prédio onde morou alguns anos atrás, mas ao invés de parar no segundo andar, onde ficava seu apartamento, continuou a andar até chegar terraço. Lá de cima ela conseguia ver parte da cidade, uma pequena parte que para ela já parecia ser do tamanho do mundo. A escuridão da noite contrastando com a neve a fazia pensar na escuridão dos seus pensamentos que contrastava com a palidez de sua pele e sua aparente inocência.  Inocência que ela lutou para manter, mas que a vida quis roubar. A fazia pensar na pureza de criança que um dia carregou, e na batalha que travou para tentar fazer isso sobreviver. Batalha, que ao contrário do desejado, a fez crescer. Pensou em toda a dor, todas as lágrimas, todo o sangue derramado, todas as marcas que ficarão para sempre em sua pele e em sua alma. Nada fazia sentido, ela estava cansada. Todos os dias tentava se convencer de que valia a pena continuar. Tentava encontrar a que se prender, mas nada servia. As músicas a faziam chorar, os livros não tinham mais o mesmo valor, a comida não tinha sabor. Ela não tinha mais amigos, pois seu coração era amargo demais para conseguir confiar. Ela deitava e, muitas vezes, não dormia. Quando dormia, seus sonhos era quase piores que a realidade.  Ela sonhava com seus fantasmas. Ela fantasiava sua morte. Às vezes, chagava a desejá-la. Ela acordava e não queria levantar. Cada segundo do dia havia se tornado uma tortura sem fim. 
Andou um pouco e passou por cima da parede de proteção, sentou-se na beirada, com as pernas penduras, olhos fixos no chão. Naquele momento, ela entendeu o que a fez chegar até ali, inconscientemente já havia decidido que não queria mais continuar. Respirou fundo aquele ar gelado. Ficou de pé, abriu os braços e pulou. Um par de asas surgiu de suas costas, ela estava livre. Clarisse voou. 

Na manhã seguinte, lia-se uma manchete de jornal: Garota encontrada morta apos "cair" do terraço de um prédio. Policia investiga se foi assassinato ou suicido. Identidade ainda desconhecida.  Sabe-se apenas que carregava um pingente no formato de um par de asas.   



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