O sinal tocou
anunciando que é hora de entrar na sala de aula. A turma está toda agitada,
afinal é o último dia de aula. Levou um bom tempo até que os professores
conseguissem reunir os alunos dentro da sala. Começou então a espera que parece
eterna, alguns roíam as unhas e outros quase choravam enquanto a professora chamava
o nome de cada um por ordem alfabética na lista de chamada. A cada nome, uma
comemoração por ser aprovado ou lamento por ter que repetir o ano. Enfim chegou
minha vez.
- Lucas?
Ao ouvir meu
nome, instantaneamente meu coração disparou. Eu fiquei tenso e quase não
consegui responder. – Aqui professora.
Ela me olhou com
uma expressão de compaixão, percebi logo que não viria uma boa notícia.
- Não atingiu
a pontuação necessária, mas ainda tem uma chance. A prova de recuperação será próxima
semana. Farão a prova juntas a turma A e a turma B.
Suspirei
tristemente, minha mãe não vai gostar de saber disso.
Os nomes
seguintes passaram indistintos e depois fui para casa.
Já em casa, minha
mãe brigou um pouco comigo, mas foi menos do que eu esperava. Ela disse que
devo passar a semana estudando, nada de sair com os amigos até passar essa
prova. E assim passei final de semana e a semana toda, na noite da quinta-feira
eu mal consegui dormir.
A sexta-feira amanheceu chuvosa, o dia parecia
triste, o que me causou um mau presságio.
Tomei banho,
me arrumei e tomei o café da manhã.
- Boa prova
filho. Desse-me minha mãe quando me viu passa em frente ao quarto dela.
Cheguei à
escola e vi vários alunos esperando para fazer a prova de recuperação. É ótimo ver
que não sou o único fracassado. Uma pessoa em especial me chamou atenção. Natália,
a garota mais nerd da turma estava lá. Como pode ela está de recuperação? Há
dois anos eu nutro uma paixão secreta por ela, mas não tive coragem de me
declarar. O que uma nerd pode querer com um garoto burro como eu?
Sentei no meu
lugar de costume, no fundo da sala, mas quando a professora chegou, ela me
mandou sentar na frente. Justo ao lado da Natália.
Fizemos a
prova e, quando todos terminaram, a professora avisou que o resultado sairia
dali a duas semanas. Ela tinha provas de várias turmas para corrigir. Que
ótimo, duas semanas de tensão!
Eu fui para o
pátio lanchar para depois ir embora. Para minha surpresa uma voz me chamou.
-Lucas! Como
você acha que se saiu na prova?
Virei na
direção dessa voz sem acreditar, era Natália que falava comigo. Respondi
gaguejando.
-Aacho que
fui mal.
-Que pena. Ela
disse.
Passamos um
tempo conversando e eu não resisti. Confessei o meu amor por ela. Quase choro
quando ela me disse que também me amava. Eram lágrimas de felicidade, mas tive
que contê-las. Meu pai me ensinou que homens não choram.
Aproximei-me
dela bem devagar, meus lábios estavam quase tocando os dela. Eu estava com
medo, meu coração parecia que ia sair do meu peito. Ela sussurrou:
-Te amo.
-Eu também te
amo, respondi. E então, beijei-a.
Nosso beijo foi
delicado. O cheiro dela invadia minhas narinas, era suave. Natália era
delicadeza em pessoa. Meus dedos acariciavam seus lindos cabelos ruivos.
No mesmo dia
eu fiz o pedido de namoro e ela aceitou. Ficamos juntos a tarde inteira.
Conversamos, tomamos sorvete. Descobri que ela gosta de ler, eu nunca curti
muito, mas ouvi-la falando sobre os seus livros favoritos foi uma das melhores
sensações que eu já tive. Seus olhos brilhavam. Ela estava linda. Despedimos-nos
no fim da tarde com a promessa de voltarmos a nos ver na manhã seguinte.
Contei a
novidade a minha mãe que me parabenizou e disse que queria conhecê-la. Mas não
deixei de levar bronca por achar que fui mau na prova. Dormi aquela noite com a
lembrança do beijo de Natália. Do meu primeiro beijo.
Encontrei
minha namorada no dia seguinte, e no próximo... Descobríamos cada vez mais
coisas que gostávamos um no outro. As duas semanas de espera do resultado
acabaram sendo semanas mágicas.
No dia
marcado, fui à escola receber minha prova. Assim que vi meu amor, dei-lhe um
beijo e fomos de mãos dadas para a sala de aula. A professora entregou as
provas, mas não tive coragem de olhar a minha. Natália recebeu a dela e se
dirigiu a minha direção.
- Passei
amor. Disse-me com um sorriso nos lábios.
- Ainda não
tive coragem de olhar a minha.
- Deixa de
ser bobo, olha logo.
- Nota quatro.
Parece brincadeira, mas vou ter que repetir o terceiro ano.
Saímos da
sala um pouco triste. Minha mãe quase ma mata, mas não havia mais nada para
fazer. Passei o restante das férias curtindo meu amor.
Faltavam dois
dias para começarem as aulas. Pela manhã, Natália me disse que precisava
conversar comigo. Notei certa urgência e tristeza. Encontramos-nos no parque.
As palavras dela partiram meu coração.
-Vou ter que
ir embora. Minha família vai se mudar e farei faculdade em outro estado.
Fiquei sem
reação. As lágrimas rolaram e eu não pude evitar. Ela me beijou. Seus olhos também
derramavam sua tristeza. Nosso beijo foi regado pelas lágrimas dos dois. Foi
salgado. Foi doloroso. Foi intenso. Ficamos juntos o resto do dia.
Dez minutos depois
de chegar em casa, eu ainda não havia conseguido parar de chorar. Antes de vir
embora tentei convencê-la a encarar um namoro a distância, mas nem eu tinha certeza
se daria certo. Ela me disse que nosso amor é de outras vidas e que, um dia,
ficaremos juntos. Não sei se acredito nessa história.
Adormeci e
tive um sonho. Natália me beijava no pátio da escola, onde demos nosso primeiro
beijo, mas diferente do primeiro, este não era um beijo delicado. Era forte,
urgente. Acordei ofegante. Chorei ao imaginar que poderia nunca mais tê-la
comigo.
As aulas vão
começar, mas eu não reclamo mais por ter de repetir o último ano do ensino
médio. Se não fosse minha falha, minha nota ruim, eu não teria vivido o mês
mais intenso da minha vida. O mês mais feliz que tive até hoje.
São oito da manhã
e me ponho a recordar o que aconteceu desde o dia da prova de recuperação. O vôo
dela estava previsto para as sete da manhã. Eu não fui ao aeroporto, pois não
suportaria vê-la partir. Natália já deve ter ido embora e talvez eu não volte a
vê-la.
Com isso, ela
apenas confirmou o que eu já sabia: Pássaros não nasceram para viver em
gaiolas.